quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Utopia
            Nevo
Eu tenho uma Utopia que pouco se compara a Pasárgada porque lá é indiferente se eu sou ou não amigo do Rei. Ela me alimenta diariamente. Embala meu sono e meus sonhos de forma tão concreta que ponho em dúvida minha sanidade. Mas essa condição patológica me faz tanto bem, que a considero um estado terapêutico transitório na trajetória zenital rumo à felicidade plena.
Olho em minha volta e vejo o trânsito de pessoas e coisas do mundo real contextualizado... Não me afligem suas histórias, dramas, ações e reações benéficas ou não. Tenho em mim a certeza de que seus presentes momentâneos estão a um passo do futuro utópico.

Utopia está logo ali! Todos lhe têm acesso livre e ninguém é impedido dela se ausentar. Todos cuidam de suas vidas com esmero, o que inclui atenção ao próximo que está a uma distância imensurável. Tanto pode ser o infinitésimo como a infinitude, pois o espaço não se mede pelas convenções métricas humanas, mas pela qualidade do amor.
O cargo maior, que aqui chamo de Rei, não vem da descendência de uma dinastia, nem é fruto de alguma conquista armada. É naturalmente ocupado pelo mais sábio, que detém mais conhecimento e tem maior envergadura moral. Sua autoridade é reconhecida por sentidos desconhecidos de todos nós, que os interpretamos como meros reflexos do instinto.
O Rei não precisa comandar e nem decretar leis porque cada um já conhece suas obrigações e age exatamente de acordo com as necessidades vigentes. Ninguém se omite diante das circunstâncias que se apresentam a cada momento. Todos vivem em comunhão sem que seja necessário alguém que lhes direcione as ações, tal como se vivesse numa sociedade ideal, como num tipo de anarquismo em que a presença do Estado é plenamente dispensável.
As instituições existem apenas como forma de organização, pois, afinal, todas elas têm como objetivo fundamental o bem social e não há propriedade privada. Todos os bens são públicos.
Em Utopia ninguém é perfeito e todos estão sujeitos a cometer erros. Mas estes denotam apenas a necessidade de diversificar experiências para intensificar o aprendizado. Quando uma pessoa se equivoca, não se sente envergonhada e nem causa vergonha à sociedade, pois todos sabem que estão num processo de aprendizado contínuo e se auxiliam mutuamente para o progresso individual e coletivo.
Na verdade nem existe “erro”. Cada evento é considerado apenas como nova experiência, cada uma com seu resultado. Ou seja, aquilo que aqui chamamos de “erro”, em Utopia é tão somente um experimento com resultado inesperado, que é incorporado ao conhecimento. São eventos que enriquecem a cultura utopiana.
Aliás, por falar em cultura, por lá as artes, os esportes e o lazer fazem parte do cotidiano de todas as pessoas, crianças, jovens, adultos e idosos. Todos têm diariamente pelo menos uma hora dedicada a tais atividades, que se imiscuem umas nas outras porque se faz arte por esporte, do esporte se faz arte e ambos constituem também um lazer.
A educação é formalizada em instituições multidisciplinares que se prestam ao mesmo tempo para as crianças da mais tenra idade até os adultos em formação, que enquanto estudam põem em prática seu aprendizado. As famílias são elementos integrantes do processo educativo e suas atividades profissionais são tão próximas quanto possível das instituições de ensino. Estas geralmente fazem parte do conglomerado que permite às pessoas desenvolverem todas as suas atividades diárias sem grandes deslocamentos.
A saúde pública é um dos fundamentos básicos da sociedade utopiana. Os recursos, em sua maioria, são empregados na prevenção e os raros casos de doenças são preferencialmente tratados em domicilio por agentes especializados. Somente em situações excepcionais os pacientes são removidos para as unidades de internação existentes na própria comunidade.
Trabalho remunerado? Salário? Para que? Não existe nada para se comprar e nem mesmo existe dinheiro. Todos podem pegar o que quiser nos grandes depósitos comunitários, cujos registros de saída servem somente para levantamentos estatísticos e para organizar o reabastecimento.
Ah, diriam alguns, mas e se eu quiser ter um automóvel para passear com a família num final de semana? Para resumir, respondo primeiro que em Utopia não existe “fim de semana”, pois não existe começo. Nem mesmo existe medida de tempo porque ninguém se preocupa com ele. O máximo de correspondência com o nosso sistema horário é que há dia e noite. Se alguém desejar passear com a família, basta requisitar um transporte familiar adequado àquela necessidade específica, que será imediatamente atendido.
Nas atividades diárias ninguém sente necessidade de transporte particular porque os veículos públicos suprem perfeitamente as demandas da população.
Quem paga tudo isso? Como o governo oferece tantos serviços sem arrecada impostos?
Ora, ninguém paga nada porque ninguém lucra absolutamente nada. Todos os trabalhos são feitos por amor à evolução individual e coletiva. Ou seja, todo o impulso vem do interesse no bem comum. É uma comunidade. Todos vivem em comunhão. É uma forma comunista de viver.
Utopia é o lugar onde a felicidade é presente na vida das pessoas. Não porque alguém se julgue em estágio de máxima evolução, mas porque todos estão adaptados á forma de viver, conscientes de que sua vontade de crescer e de exercer o máximo do altruísmo é que lhes alimenta a felicidade, que é plena porque, afinal, residem em Utopia.




Nenhum comentário:

Postar um comentário

Sua opinião é importante! Mesmo os pensamentos divergentes serão liberados para publicação, mas é imprescindível que se utilize linguagem adequada, educada e respeitosa, sem ofensas pessoais e/ou institucionais.